Informativo TCU 466 – Licitações e Contratos – Licijur – Consultoria em Licitações e Contratos

Informativo TCU 466 – Licitações e Contratos

1. No âmbito da Lei 8.666/1993, desde que haja previsão no edital, é possível a participação em licitação de empresas em processo de fusão, cisão ou incorporação, uma vez que a administração contratante tem o poder discricionário de admitir ou não que tais empresas participem do certame.

Representação formulada ao TCU apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 121/2022, conduzido pela Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES/DF) e tendo por objeto a contratação de “prestação de serviços de limpeza, higienização, conservação, asseio e desinfecção hospitalar nas unidades da SES/DF”. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque o “impedimento de participação de empresas em recuperação judicial ou em processos de fusão/cisão/incorporação”. Realizada a oitiva da SES/DF acerca dessa vedação constante do edital da licitação, suas justificativas não foram acolhidas pela unidade técnica, a qual propôs, em razão disso, cientificar o órgão distrital da irregularidade, por ela delineada nos seguintes termos: “vedação à participação no certame por pessoas jurídicas em processo de dissolução, recuperação judicial ou extrajudicial, falência, concordata, concurso de credores, liquidação, fusão, cisão ou incorporação, contrariando os princípios da competitividade e da motivação, o art. 31 da Lei 8.666/1993 e a jurisprudência do TCU.”. Em seu voto, o relator divergiu parcialmente da proposta da unidade técnica, assinalando que, nada obstante concordar com a proposição de ciência, caberia reformulação “para melhor adequá-la à jurisprudência do Tribunal”. Segundo ele, de fato, no Acórdão 1201/2020-Plenário, o TCU assentara o entendimento de que “Admite-se a participação, em licitações, de empresas em recuperação judicial, desde que amparadas em certidão emitida pela instância judicial competente afirmando que a interessada está apta econômica e financeiramente a participar de procedimento licitatório”. Nessa mesma toada, no Acórdão 2265/2020-Plenário, a Corte de Contas entendera que “A certidão negativa de recuperação judicial é exigível por força do art. 31, inciso II, da Lei 8.666/1993, porém a apresentação de certidão positiva não implica a imediata inabilitação da licitante, cabendo ao pregoeiro ou à comissão de licitação diligenciar no sentido de aferir se a empresa já teve seu plano de recuperação concedido ou homologado judicialmente (Lei 11.101/2005)”. O relator acrescentou que o STJ teria também reafirmado seu entendimento no sentido de que “a circunstância de a empresa se encontrar em recuperação judicial, por si só, não caracteriza impedimento de contratação com o Poder Público, ainda que não seja dispensada da apresentação das certidões de negativas fiscais” (Resp. 1.826.299, Segunda Turma), e que, naquele caso concreto, o qual tratava de “mandado de segurança impetrado por empresa que se sagrou vencedora em licitação para construção de outra etapa do campus da Universidade Federal de Cariri/CE, mas fora informada, posteriormente, que o referido contrato não seria assinado, em razão da impetrante encontrar-se em recuperação judicial”, a empresa licitante, a despeito de se encontrar em recuperação judicial, comprovara possuir capacidade econômico-financeira para honrar o contrato, razão por que o Tribunal de origem se manifestara concedendo a ordem pleiteada”. No STJ, o recurso especial fora então “improvido”. Nesse contexto, o relator afirmou restar evidente, “seja na jurisprudência do TCU, seja na jurisprudência do STJ, que a circunstância de a empresa se encontrar em recuperação judicial ou extrajudicial não pode ser impedimento em caráter definitivo para a sua participação em licitação”, e que, outrossim, a exigência “extrapolaria o disposto no art. 31, inciso II, da Lei 8.666/1993”. No entanto, conforme o relator, situação diversa ocorreria com as hipóteses de fusão, cisão ou incorporação contempladas no edital, ou seja, com relação a essas hipóteses, a jurisprudência do TCU “não segue a mesma linha da recuperação judicial”, e reforçou que “a fusão, cisão ou incorporação, não admitidas no edital e no contrato” constituem hipóteses de extinção do contrato administrativo, nos termos do art. 78, inciso VI, in fine, da Lei 8.666/1993. A corroborar sua assertiva, invocou o Acórdão 2050/2014-Plenário, no qual restara assentado o seguinte entendimento: “É admitida a reorganização da pessoa jurídica contratada, por meio de cisão, incorporação, fusão, alteração social ou modificação da finalidade ou da estrutura da empresa, desde que: (i) haja previsão no edital e no contrato (art. 78, inciso VI, da Lei 8.666/1993); (ii) a nova empresa atenda aos requisitos de habilitação originalmente previstos na licitação (art. 27, da Lei 8.666/1993); e (iii) as condições estabelecidas no contrato original sejam mantidas.”. Portanto, concluiu o relator, “no âmbito da legislação em vigor (Lei 8.666/1993), a administração contratante tem o poder discricionário de restringir a participação de empresas em processo de fusão, cisão ou incorporação, não cabendo, portanto, dar ciência a respeito”. Pontuou, no entanto, que “essa disciplina jurídica se altera sensivelmente com o advento da nova lei de licitações. De fato, com o novo diploma legal, apenas a ‘alteração social ou modificação da finalidade ou da estrutura da empresa que restrinja sua capacidade de concluir o contrato’ é circunstância apta para a extinção do ajuste contratual (art. 137, III, Lei 14.133/2021). Portanto, a administração não tem mais o poder discricionário de impedir a participação de empresas em fusão, cisão ou incorporação, mas essas devem comprovar a capacidade econômico-financeira de concluir o contrato.” (grifos do relator). Nesse cenário, sustentou que o texto da ciência, proposto pela unidade instrutiva, deveria ser alterado para se restringir às hipóteses de recuperação judicial e extrajudicial, na esteira da jurisprudência do TCU e do STJ. Por fim, destacando que, segundo os documentos constantes dos autos, tal constatação não acarretara restrição à competitividade do certame, isso aliado ao fato de que teria havido “redução nos preços anteriormente pagos pela SES/DF para os mesmos serviços”, o relator considerou suficiente a expedição de ciência ao órgão, “a fim de prevenir futuras situações análogas”. Assim sendo, nos termos propostos pelo relator, o Plenário decidiu considerar a representação parcialmente procedente, sem prejuízo de, quanto ao ponto específico, cientificar a SES/DF sobre a seguinte ocorrência constatada no certame em tela: “vedação absoluta à participação no certame por pessoas jurídicas em recuperação judicial ou extrajudicial, contrariando a jurisprudência do TCU (Acórdãos 1.201/2020 – Plenário e 2.265/2020 – Plenário) e do Superior Tribunal de Justiça (Resp. 1.826.299)”.

Acórdão 1697/2023 Plenário, Representação, Relator Ministro Jorge Oliveira.

2. Em contratações formalizadas no âmbito do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – Contratação Integrada (RDCi), os critérios de medição e pagamento devem estar associados à execução de etapas vinculadas ao cumprimento de metas (art. 8º, inciso V, da Lei 12.462/2011 e art. 46, § 9º, da Lei 14.133/2021), definidas no cronograma físico-financeiro, caracterizando os marcos ou pontos de controle, de modo a viabilizar o adequado acompanhamento da execução contratual.

Em auditoria que teve como objeto termo de compromisso firmado entre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e o Departamento de Estradas e Rodagem do Estado do Acre (Deracre), no âmbito do qual o Deracre contratou consórcio de empresas para “elaboração dos projetos básico e executivo de engenharia e implantação do contorno rodoviário de Brasiléia/AC (10,3 km de extensão) e construção da ponte sobre o rio Acre (250 m de extensão)”, mediante o Regime Diferenciado de Contratações – Contratação Integrada (RDCi) de que trata a Lei 12.462/2011 (Lei do RDC), foram apontados, entre outros, os seguintes achados: “[…] b) Achado III.2 – Termo de referência inadequado; c) Achado III.3 – Anteprojeto deficiente; d) Achado III.4 – Existência de atrasos que podem comprometer o prazo de entrega do empreendimento”. Em fase anterior do processo, o relator, entendendo que a suspensão total das obras seria mais gravoso ao interesse público do que o acompanhamento minucioso da execução contratual, “permitiu a continuidade dos serviços e determinou ao Dnit que apresentasse o cronograma de análise e aprovação das etapas do projeto básico da obra referente ao contrato, compatível com a vigência do Termo”. Analisados os elementos apresentados pelo Dnit, a equipe de auditoria se manifestou novamente sobre os achados da fiscalização. Acerca do Achado III.2 – termo de referência (TR) inadequado, a equipe verificou que havia omissão e imprecisão no TR de forma que não era possível identificar claramente os marcos para acompanhamento da execução contratual, tanto da fase de elaboração de projetos quanto da fase de execução das obras. Verificou, ainda, que as únicas informações existentes, a suprir a lacuna deixada pelo TR, decorreriam do cronograma físico-financeiro de referência da contratação, que apresentava, em sua “versão nova”, apenas as “mesmas onze macro etapas do empreendimento trazidas no cronograma de referência”. Diante do fato, o cronograma físico-financeiro precisaria, de acordo com a equipe, ser atualizado e detalhar as correspondentes etapas listadas nos critérios de pagamento, o caminho crítico e os marcos para acompanhamento da execução contratual, em aderência ao disposto no item 9.1.2 do Acórdão 3290/2014-Plenário, que assim dispôs: “9.1.2. em conformidade com os art. 6º, inc. IX e 8º da Lei 8.666/93; art. 2º, inciso II, alínea c da Lei 12.462/11 e art. 8º, inc. XI e art. 74, inc. II do Decreto 7.581/11: 9.1.2.1. somente publique licitações de obras e serviços de engenharia após a realização do planejamento de execução das obras, que deve refletir a real condição de execução, apontando, inclusive, nos casos de certames lastreados na Lei 8.666/93, pontos de controle e caminhos críticos; 9.1.2.2. preveja no edital, tanto nos casos regidos pela Lei 8.666/93 como naqueles regidos pelo RDC, cláusulas que obriguem a empresa contratada a apresentar cronograma de obra que reflita a condição de execução por ela prevista (desde que com prazo menor ou igual ao do edital), apontando, de forma semelhante ao edital, os pontos de controle e caminhos críticos; 9.1.2.3. estabeleça, para as obras em andamento, critérios internos objetivos para acompanhamento dos contratos, incluindo pontos de controle parciais e caminhos críticos para sua execução, de forma a promover o real acompanhamento de prazo da obra e permitir a alocação da parcela de responsabilidade das empresas contratadas;”. Já o Achado III.3 – “Anteprojeto deficiente” – fora dividido em dois itens relevantes, merecendo destaque o que apresentava a seguinte redação: “a) anteprojeto não estabeleceu os critérios de pagamento a serem adotados na execução do contrato formalizado a partir do Edital 1/2019 (Deracre) – RDCi, exigidos pela IS 09/16, em ofensa ao disposto no art. 42, § 5º do Decreto 7.581/2011 c/c art. 62 da Lei 4.320/64”. Quanto a tais critérios de pagamento, a equipe de auditoria concluiu que, apesar de o Dnit e o Deracre terem apresentado correções e esclarecimentos, “foram adotados critérios que permitem a medição de etapas de acordo com o quantitativo de serviço realizado no período sem considerar como condição necessária que as metas de resultado contratuais sejam cumpridas”. E tendo em vista que a medição relativa ao regime de preço global também se aplica aos contratos celebrados pelo regime contratação integrada, a equipe transcreveu, em seu relatório, os conceitos e diferenças entre preço unitário e preço global constantes na publicação “Orientações para Elaboração de Planilhas Orçamentárias de Obras Públicas – TCU/2014”, no capítulo “Etapas de Medição dos Serviços nas Empreitadas por Preço Global”, nos seguintes termos: “Nas empreitadas por preço unitário, mede-se cada unidade de serviço, e os pagamentos far-se-ão mediante a multiplicação das quantidades executadas pelos seus respectivos preços unitários. Nas empreitadas por preço global, de outro modo, medem-se as etapas de serviço de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra ou mediante as etapas objetivamente estabelecidas no instrumento convocatório. Em exemplo prático, terminadas as fundações, paga-se o valor global das fundações; feita a estrutura, remunera-se o valor previsto para essa etapa; concluída determinada fase da obra, com marco previamente estipulado, retribui-se o montante correspondente; até chegar ao final da empreitada, que deverá corresponder ao valor total ofertado para o objeto como um todo, no ato da licitação (preço certo e total) (Acórdão 1.977/2013 – Plenário). (…) A definição dos marcos de pagamento deve ser atrelada à execução física da obra, recomendando-se adotar eventos facilmente verificáveis pelo fiscal do contrato. (…) Devem ser evitadas medições parciais de eventos ou marcos que não estejam completamente concluídos, assim como o estabelecimento de marcos cuja conclusão demore muito tempo ou possa comprometer financeiramente a empresa construtora, considerando o porte necessário para a execução da obra.” (grifos originais). Em seu voto, o relator ressaltou que a Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) estabelece, em seu art. 46, § 9º, que, para os regimes de execução indireta admitidos para obras e serviços de engenharia que não sejam por preço unitário, entre os quais o regime de contratação integrada, deve ser adotada a sistemática de medição e pagamento associada à execução de etapas do cronograma físico-financeiro, vinculadas ao cumprimento de metas de resultado, vedada a adoção de sistemática de remuneração orientada por preços unitários ou referenciada pela execução de quantidades de itens unitários. Desse modo, considerando que a contratação em tela ocorrera pelo regime de contratação integrada e que as medições “devem estar associadas à execução de etapas vinculadas ao cumprimento de metas”, o relator concordou com a proposta da unidade técnica de dar ciência ao Dnit e ao Deracre de que, em contratações formalizadas no âmbito do RDCi, a adoção de procedimento que não considere, como condição necessária para efetuar medição e pagamento, que as metas de resultado contratuais sejam cumpridas é incompatível com o regime de contratação integrada previsto no art. 8º, inciso V, da Lei 12.462/2011 e com o que dispõe o art. 46, § 9º, da Lei 14.133/2021. Na sequência, o relator constatou que o Achado III.4 – “Existência de atrasos que podem comprometer o prazo de entrega do empreendimento” decorreria, em certa medida, dos achados anteriores, sendo, a seu ver, “evidente que a ausência de definição clara dos pontos de controle no TR comprometeu a gestão eficiente dos prazos do empreendimento e o acompanhamento da sua execução”. Ponderando sobre a necessidade de acompanhar a execução das obras e compatibilizar os cronogramas com os critérios de pagamento, o relator acolheu proposta da unidade técnica para que fosse dada ciência aos órgãos envolvidos de que, em contratos da espécie, afronta o disposto no Acórdão 3.290/2014-Plenário e no art. 42, § 5º, do Decreto 7.581/2011 a adoção de cronograma físico-financeiro sem que estejam concebidas todas as etapas a serem consideradas nas medições, apresentando os pontos de controle e suas interdependências. Assim sendo, nos termos sugeridos pelo relator, o Plenário decidiu, entre outras providências, cientificar o Dnit e o Deracre de que: “9.2.2. a desconsideração das metas de resultado contratuais como critérios de medição e pagamento é incompatível com o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – Contratação Integrada (RDCi) previsto no art. 8º, V, da Lei 12.462/2011 e com o que dispõe o art. 46, § 9º, da Lei 14.133/2021; 9.2.3. a adoção em contratos firmados no âmbito do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – Contratação Integrada (RDCi) de cronograma físico-financeiro sem a definição de todas as etapas a serem consideradas para efeito de medição, caracterizando os marcos/pontos de controle, de modo a viabilizar o adequado acompanhamento da execução contratual, caracteriza afronta ao disposto no Acórdão 3.290/2014-TCU-Plenário e no art. 42, § 5º, do Decreto 7.581/2011;”.

Acórdão 1614/2023 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Antonio Anastasia.

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